Nota de atualização: ontem (23), após o voto, o ministro Villas Bôas Cueva fez um novo pedido de vista. Com isso, o julgamento foi suspenso e uma nova data será marcada para a retomada da discussão. Assim sendo, ainda não há um entendimento final do STJ sobre a taxatividade do rol da ANS.
Hoje (23/2), a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deve retomar uma discussão que pode causar grande impacto sobre os usuários de convênios médicos.
Na ocasião, será determinado se o rol de procedimentos e eventos em saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é exemplificativo ou taxativo, decisão que afeta diretamente a cobertura dos planos de saúde.
O julgamento teve início em setembro de 2021, mas foi interrompido após divergências sobre o tema. Contudo, espera-se que hoje, a terceira e a quarta turmas do órgão entrem em acordo sobre o assunto.
Em entrevista à revista Anamaria, a advogada do Escritório Rosenbaum Advogados, explica o que pode mudar na cobertura dos planos de saúde após o julgamento do STJ e como isso impacta os segurados.
Leia a matéria na íntegra aqui.
Qual o entendimento atual sobre o Rol da ANS e a cobertura dos planos de saúde?
De acordo com a Resolução Normativa 465, de 24 de fevereiro de 2021, da ANS, o rol de procedimentos e eventos em saúde é taxativo.
Inclusive, diante da situação atual, a ANS publicou uma nota ressaltando que a própria Lei dos Planos de Saúde (nº 9.961) estabelece sua competência para definir quais procedimentos fazem parte da cobertura dos planos de saúde.
Segundo a agência, “considera-se taxativo o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde disposto nesta Resolução Normativa e seus anexos”, e que a inclusão de outros procedimentos à cobertura pode ser realizada pelo plano de saúde “por sua iniciativa ou mediante expressa previsão no instrumento contratual referente ao plano privado de assistência à saúde”.
No entanto, o entendimento atual dos Tribunais considera que a lista da ANS é somente exemplificativa.
“Atualmente, a maioria das decisões judiciais são no sentido de que o rol da ANS é meramente exemplificativo. Isto significa que tratamentos e procedimentos que não constem desta lista de cobertura obrigatória, podem vir a ser cobertos pelos planos de saúde, desde que haja indicação médica”, explica Fernanda.
Há inclusive uma Súmula do Tribunal de Justiça de São Paulo que indica a abusividade da negativa de cobertura para procedimentos não previstos pelo rol:
“Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.” (Súmula 102, TJSP)
Essa jurisprudência favorável aos consumidores é consolidada na maior parte dos Tribunais regionais.
Já no âmbito do STJ, há uma divergência de entendimentos entre as turmas:
Enquanto a terceira turma do STJ considera que este rol da ANS é meramente exemplificativo, a quarta turma do STJ considera que este rol é taxativo, e isto implica dizer que qualquer orientação médica ou prescrição que ocorrer em desacordo com este rol não merece cobertura pelo plano de saúde.
Com o julgamento que será realizado hoje pela segunda seção do STJ, será consolidado o entendimento entre as turmas, e poderá gerar um sensível prejuízo aos segurados, caso entendam que o Rol da ANS é um rol taxativo.
O que acontece se esse entendimento do STJ sobre o rol da ANS mudar?
Atualmente, o rol de procedimentos da ANS estabelece procedimentos básicos que devem fazer parte da cobertura dos planos de saúde. Por isso, a lista é interpretada como uma base para que os convênios precifiquem seus planos e estabeleçam suas coberturas.
Assim sendo, nos últimos 20 anos, os Tribunais brasileiros consolidaram o entendimento de que a falta de previsão no rol da ANS não significa que um procedimento não deva ser coberto pela operadora.
Contudo, a decisão de hoje pode alterar esse entendimento histórico, colocando os beneficiários em uma situação desfavorável.
Mesmo com o entendimento atual, muitos pacientes encontram dificuldades ao solicitar a cobertura dos planos de saúde para seus tratamentos, especialmente os que envolvem tecnologias e medicamentos de alto custo.
“Se ficar definido que o rol é taxativo, porém, a tendência de decisões favoráveis aos beneficiários poderia diminuir, deixando ainda mais difícil o tratamento para procedimentos que não estejam no rol da ANS”, ressaltou a advogada.
Segundo a especialista, “tratamentos mais modernos não seriam cobertos e a perda de acesso aos melhores procedimentos poderia trazer consequências irreparáveis aos pacientes”.
Isso porque, conforme explica a advogada durante a entrevista, embora a decisão tomada hoje não seja vinculante, ela será um indicativo para uma jurisprudência futura a ser firmada.
Assim sendo, por mais que os Tribunais inferiores ainda possam continuar proferindo decisões favoráveis aos beneficiários e concedendo liminares, a tendência é que isso se torne cada vez mais difícil diante da taxatividade do rol.
O que o consumidor pode esperar da discussão de hoje?
Em setembro de 2021, no início do julgamento, o relator dos recursos, Luis Felipe Salomão, votou a favor da taxatividade do rol da ANS.
Segundo o ministro, a lista protege os beneficiários, pois garante que somente procedimentos eficazes façam parte da cobertura dos planos de saúde. Além disso, Salomão ressaltou que a taxatividade ajuda a preservar o equilíbrio econômico do mercado.
No entanto, a análise do caso foi interrompida pela ministra Nancy Andrighi, que discorda de Salomão e será a primeira a votar hoje.
Em abril do ano passado, durante um julgamento, a ministra considerou abusiva qualquer norma infralegal (que esteja em posição inferior a uma lei) que reduza a cobertura dos planos de saúde para as condições listadas na Classificação Internacional de Doenças (CID), da Organização Mundial de Saúde.
De acordo com Nancy Andrighi, tornar o rol taxativo cria “um impedimento inaceitável de acesso do consumidor às diversas modalidades de tratamento das enfermidades cobertas pelo plano de saúde e às novas tecnologias que venham a surgir”.
Ademais, o jornal O GLOBO informou em uma matéria publicada hoje (23/2) que ouviu os ministros do STJ reservadamente e que eles são favoráveis ao entendimento de que a lista de procedimentos é exemplificativa e acreditam que o parecer será mantido.
A mobilização nas redes sociais liderada pelo Marcos Mion ajuda?
Nos últimos dias, o julgamento sobre o rol da ANS foi um assunto que ganhou forças nas redes sociais. Internautas criaram hashtags específicas para o tema e muitas pessoas têm se posicionado contra a taxatividade da lista.
Na última terça-feira (22/2), o apresentador Marcos Mion postou um vídeo em sua conta do Instagram para divulgar o assunto. A publicação já tem mais de 680 mil curtidas e quase 18,5 mil comentários.
Nela, o apresentador expõe como a mudança no entendimento do STJ pode afetar a vida de milhões de usuários dos planos de saúde principalmente aqueles, por exemplo, que sofrem de Transtorno do Espectro Autista (TEA) e estavam recebendo tratamentos que não constavam do rol mas que tinham prescrição médica e cobertura pelos planos de saúde, conforme entendimentos dos próprios tribunais.
No entanto, a advogada afirma que, infelizmente, a pressão popular não é suficiente para interferir na decisão. A mobilização na internet é somente uma forma de sensibilizar os julgadores.
E se o plano negar a cobertura do procedimento?
Nessa situação, existe a possibilidade de levar a situação ao poder judiciário e, assim, contestar a negativa recebida.
“Na prática, os tratamentos e procedimentos não constantes do rol, tem a sua cobertura negada. No entanto, é possível ingressar com ação judicial para buscar esta cobertura com boas chances e sucesso”, ressalta a advogada;
Visto que, atualmente, o entendimento judicial é favorável ao consumidor, muitas pessoas garantem o tratamento dessa maneira.
Para ajuizar a ação, é recomendável buscar a orientação de um advogado especialista em Direito à Saúde e Direitos do Consumidor. Além disso, o paciente deve reunir alguns documentos:
- a recomendação médica do tratamento com [Nome do Remédio];
- a negativa de cobertura por escrito (ou então o protocolo de atendimento caso a recusa tenha sido informada por ligação);
- comprovantes de pagamento (caso o paciente tenha sido obrigado a arcar com as próprias despesas) para solicitar reembolso;
- o comprovante de residência;
- a carteirinha do plano de saúde;
- o contrato com o plano de saúde (se possível);
- cópias do RG e do CPF;
- comprovantes de pagamentos das mensalidades (geralmente as duas últimas).
O Escritório Rosenbaum Advogados tem vasta experiência no setor de Direito à Saúde e Direitos do Consumidor. O contato pode ser feito através do formulário no site, WhatsApp ou pelo telefone (11) 3181-5581. O envio de documentos é totalmente digital.