Imagine planejar uma viagem de fim de ano perfeita, com tudo incluído – voos, hotel, passeios e até carro alugado – só para descobrir que uma mudança inesperada no voo bagunça tudo, forçando você a gastar mais para salvar o resto do plano.
Isso aconteceu com um consumidor que buscou indenização por alteração de voo em pacote turístico. Na sua decisão, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) mostrou que os direitos dos viajantes estão mais protegidos do que nunca.
O caso destaca como agências de turismo podem ser responsabilizadas quando falhas em serviços integrados causam prejuízos, servindo como alerta para quem enfrenta situações semelhantes.
Entendendo o problema: quando uma alteração de voo arruína o pacote inteiro
Viagens organizadas por pacotes turísticos são populares por sua conveniência, mas problemas como cancelamentos ou alterações em voos podem transformar o sonho em pesadelo.
No exemplo analisado, o consumidor adquiriu um pacote completo para o período de 20 a 25 de dezembro de 2024, incluindo transporte aéreo, hospedagem, atividades recreativas e locação de veículo.
Tudo parecia alinhado até que a companhia aérea responsável pelo voo alterou unilateralmente o itinerário: a ida foi adiada para 23 de dezembro, e a volta, para 30 de dezembro. Isso criou um descompasso total, pois os outros serviços – como reservas de hotel e passeios – permaneceram nas datas originais, tornando a viagem impraticável sem ajustes caros.
O consumidor, para não perder tudo, precisou comprar novas passagens aéreas por conta própria, arcando com um custo extra de R$ 3.142,44.
Essa situação ilustra um problema comum no setor de turismo: a interdependência dos serviços em um pacote. Quando um elo falha, o todo pode desabar, deixando o viajante com prejuízos financeiros e frustrações.
De acordo com dados da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), alterações e cancelamentos de voos afetaram milhões de passageiros em 2024, muitas vezes impactando pacotes vendidos por intermediários. Esses incidentes não são isolados; relatórios do Procon-SP indicam um aumento de 20% nas queixas relacionadas a pacotes turísticos no último ano, frequentemente envolvendo descompassos entre voos e outros componentes.
Além disso, o caso revela como as agências de turismo, ao venderem pacotes integrados, assumem implicitamente a responsabilidade pela harmonia entre os serviços. Não se trata apenas de vender bilhetes ou reservas separadas, mas de oferecer uma experiência coesa.

Quando uma alteração unilateral ocorre, sem opções viáveis de ajuste, o consumidor acaba suportando o ônus, o que contraria princípios básicos de proteção ao comprador. Exemplos semelhantes incluem viagens afetadas por greves, condições climáticas ou falhas operacionais, onde o viajante é deixado à própria sorte, precisando reorganizar tudo às pressas e com custos adicionais.
A resposta da agência e a batalha judicial
A agência envolvida, Decolar.com, defendeu-se alegando que atuava apenas como intermediadora, sem controle sobre as decisões da companhia aérea – no caso, a Latam Airlines. Eles argumentaram falta de responsabilidade solidária, atribuindo toda a culpa à transportadora e negando qualquer falha em sua prestação de serviços.
Inicialmente, o juiz de primeira instância concordou, julgando o pedido improcedente e condenando o consumidor a pagar custos processuais. No entanto, o consumidor apelou, destacando que o pacote foi vendido como um produto integrado, com a agência assumindo a obrigação de coordenar todos os elementos para garantir compatibilidade.
A apelação enfatizou que a recusa da agência em oferecer soluções, como realocação em voos adequados ou ajustes nos outros serviços sem custos adicionais, configurava uma falha na prestação de serviço. Essa linha de argumentação ressoou no tribunal superior, que reformou a decisão.
O relator observou que a agência não provou a ausência de falha, reforçando que, em pacotes turísticos, a responsabilidade vai além da mera venda, abrangendo a garantia de usabilidade integral.
O processo judicial evoluiu de uma sentença inicial desfavorável para uma vitória em segunda instância, ilustrando a importância de persistir em apelações quando há base legal sólida. A agência contestou com base em sua posição de intermediária, mas o tribunal rejeitou isso, citando a integração da cadeia de fornecedores.
Esse embate destaca um padrão em litígios de turismo: empresas tentam se eximir transferindo culpa para parceiros, mas os juízes cada vez mais aplicam a solidariedade para proteger o elo mais fraco, o consumidor.
Fundamentação legal: o papel do Código de Defesa do Consumidor
A decisão se baseou principalmente no Código de Defesa do Consumidor (CDC), lei que protege os direitos dos compradores em relações desiguais com fornecedores.
Especificamente, os artigos 7º (parágrafo único), 14 e 25 (§1º) foram citados para estabelecer a responsabilidade solidária dos integrantes da cadeia de consumo. Isso significa que, mesmo que a alteração tenha partido da companhia aérea, a agência de turismo – como parte da cadeia – responde pelos danos causados.
O relator do caso, Thiago de Siqueira, explicou que a agência não é mera vendedora de bilhetes isolados, mas fornecedora de um serviço completo. Ao comercializar o pacote, ela assume o risco de incompatibilidades e deve provar que não houve falha – o que não ocorreu aqui.
Esses princípios do CDC garantem que o consumidor não fique desamparado. O artigo 14, por exemplo, impõe responsabilidade objetiva (independentemente de culpa) pela reparação de danos materiais, como os gastos extras com novas passagens.
No contexto de pacotes turísticos, isso se alinha à Resolução 400 da ANAC, que exige assistência em casos de alterações, mas o CDC vai além, abrangendo toda a cadeia. Outros artigos relevantes incluem o 20, que trata de vícios em serviços, e o 34, que responsabiliza quem se beneficia da oferta.

Essa fundamentação não só resolve o caso específico, mas estabelece um marco para interpretações futuras, incentivando agências a adotarem protocolos mais robustos de coordenação com transportadoras aéreas e hotéis.
Ademais, o tribunal considerou a inversão do ônus da prova, prevista no artigo 6º do CDC, onde cabe ao fornecedor demonstrar a ausência de defeito no serviço. No caso, a agência falhou nisso, o que fortaleceu a posição do consumidor.
Essa abordagem legal reflete uma tendência jurisprudencial em São Paulo, onde decisões semelhantes acumulam-se, protegendo viajantes de práticas que priorizam lucros sobre satisfação.
Decisão garante indenização por alteração de voo em pacote turístico
O tribunal deu provimento ao recurso, condenando a agência a ressarcir os R$ 3.142,44 gastos com as novas passagens, corrigidos desde o desembolso e acrescidos de juros de 1% ao mês a partir da citação. Além disso, a agência foi obrigada a pagar as custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 1.500,00 por equidade.
Essa vitória não só compensou o prejuízo imediato, mas reforçou que agências não podem se eximir de responsabilidade em pacotes integrados.
Essa decisão tem relevância ampla, podendo influenciar casos semelhantes ao estabelecer que alterações em voos comprometem o pacote inteiro, obrigando fornecedores a oferecer soluções compatíveis.
Orientação prática para quem enfrenta alteração de voo em pacote turístico
Se você está passando por algo similar, comece documentando tudo: guarde e-mails, comprovantes de compra, notificações de alteração e recibos de gastos extras. Notifique a agência por escrito, exigindo soluções como reembolso, realocação ou ajustes sem custos.
Em seguida, considere reclamar em órgãos como o Procon ou a plataforma Consumidor.gov.br, que mediam disputas gratuitamente.
Se não resolver, uma ação judicial pode ser viável. Lembre-se: o CDC inverte o ônus da prova, cabendo à agência demonstrar que não falhou.
Para maximizar chances, é recomendável buscar apoio jurídico especializado em direitos do passageiro aéreo. Profissionais experientes podem analisar seu caso, citar precedentes como esse e negociar ou litigar efetivamente, garantindo que seus direitos sejam respeitados sem mais estresse.
Casos como esse mostram que o judiciário está atento aos direitos dos consumidor, promovendo equilíbrio nas relações de consumo. Ao priorizar a proteção do consumidor, decisões assim incentivam práticas mais responsáveis no setor de turismo.
Dados objetivos do caso:
- Data da decisão: 1º de agosto de 2025
- Número do processo: 1001935-77.2025.8.26.0068