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Falha técnica em aeronave e atraso de 22 horas geram dever de indenizar

Direito Aéreo, Notícias
Passageiro aguardando no aeroporto buscando saber sobre indenização por falha técnica em voo após cancelamento.
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Redação

Publicado: dezembro 8, 2025
Tempo estimado de leitura: 8 minutos

Imagine a situação: você embarca para uma longa viagem internacional, prepara-se para descansar, mas, poucas horas após a decolagem, o piloto avisa que a aeronave precisará retornar ao aeroporto de origem devido a problemas mecânicos. O transtorno, o susto e a perda de compromissos gerados por esse tipo de evento são imensuráveis e desgastantes.

Recentemente, o Judiciário paulista analisou um caso exatamente com esse cenário, reafirmando que o consumidor tem direito a indenização por falha técnica em voo quando a prestação do serviço é defeituosa.

Neste artigo, vamos analisar em detalhes como a Justiça protege o passageiro quando a companhia aérea alega “manutenção não programada” para justificar atrasos e cancelamentos, utilizando um caso real recente como exemplo prático. Se você passou por algo semelhante, entenda agora a extensão dos seus direitos e como buscar reparação.

O caso: de Copenhague a Porto Alegre com escala frustrada

No caso em análise, um passageiro programou sua viagem de retorno ao Brasil saindo de Copenhague com destino a Porto Alegre, com conexões previstas em Amsterdã e Guarulhos.

Tudo parecia normal no primeiro trecho da viagem. Contudo, após decolar de Amsterdã com destino a São Paulo, cerca de duas horas após o início do voo, a tripulação anunciou uma falha técnica que exigia o retorno emergencial à Holanda.

Ao desembarcar novamente na origem, o consumidor foi informado de que sua viagem só poderia ocorrer no dia seguinte. Ele foi realocado em um novo itinerário operado por uma companhia parceira, a TAP, com destino a Lisboa, para de lá seguir para Porto Alegre.

Essa mudança drástica resultou em um atraso de voo de 22 horas em relação ao horário originalmente contratado para a chegada.

A defesa da companhia aérea, a KLM, sustentou em juízo que o adiamento foi estritamente necessário por questões de segurança, devido a uma manutenção não programada na aeronave. A empresa alegou que prestou a assistência necessária e que o evento fugia ao seu controle, tentando caracterizar o episódio como um imprevisto que não geraria dever de indenizar.

No entanto, a Justiça não aceitou essa justificativa para isentar a responsabilidade da transportadora.

Indenização por falha técnica em voo: a responsabilidade da companhia

Um dos pontos centrais para quem busca indenização por falha técnica em voo é compreender o conceito de responsabilidade objetiva previsto no Código de Defesa do Consumidor (CDC).

A decisão judicial destacou que a relação entre passageiro e companhia aérea é, indiscutivelmente, uma relação de consumo. Isso significa que a empresa responde pelos danos causados ao cliente independentemente de culpa.

A lei determina que a condenação da empresa somente pode ser afastada se ela provar que o defeito no serviço não existiu ou que a culpa foi exclusiva do consumidor ou de terceiros, o que não ocorreu neste caso específico.

O mito do “fortuito externo” em problemas mecânicos

É muito comum que as companhias aéreas aleguem que problemas técnicos são “imprevistos”, casos de força maior ou o chamado “fortuito externo” para evitar o pagamento de indenizações. Contudo, o entendimento consolidado nos tribunais brasileiros segue uma lógica diferente e protetiva ao consumidor.

Aeronave parada na pista passando por manutenção não programada considerada fortuito interno.

Na sentença analisada, a magistrada foi clara ao afirmar que problemas mecânicos repentinos, embora indesejados, são considerados “fortuito interno”. Ou seja, a manutenção das aeronaves e eventuais falhas técnicas fazem parte do risco do negócio da aviação. A empresa aufere lucros com essa atividade complexa e, portanto, deve arcar com os riscos inerentes a ela.

O documento judicial ressalta que “eventuais problemas internos à companhia fazem parte do risco assumido pela prestadora de serviço”. Portanto, esses problemas não podem ser utilizados como escudo para deixar o passageiro desamparado.

Mesmo que a manutenção seja necessária para a segurança — o que é indiscutível e prioritário —, os direitos do passageiro aéreo permanecem intactos, e os danos decorrentes dessa falha na prestação do serviço devem ser reparados.

A importância da assistência material e o dever de informação

Além da questão da falha técnica em si, outro ponto crucial abordado na decisão foi a falha no dever de informação e na assistência ao passageiro durante a crise.

Segundo a Resolução 400 da ANAC, citada na decisão, quando há alterações de voo, atrasos ou cancelamento de voo, a companhia tem obrigações claras dependendo do tempo de espera do passageiro:

  • Superior a 1 hora: Facilidades de comunicação (internet, telefonemas);
  • Superior a 2 horas: Alimentação (voucher, lanche ou refeição);
  • Superior a 4 horas: Serviço de hospedagem (em caso de pernoite) e traslado de ida e volta entre o aeroporto e o local de acomodação.

No caso relatado, embora a empresa tenha oferecido hospedagem e alimentação, a realocação imposta resultou na perda de compromissos importantes do passageiro e a comunicação foi falha. A decisão ressaltou que a empresa não comunicou o ocorrido com a devida antecedência e falhou em fornecer meios alternativos satisfatórios.

A lei determina que o transportador deve oferecer alternativas ao passageiro, como reacomodação em voo próprio ou de terceiro na primeira oportunidade, reembolso integral ou execução do serviço por outra modalidade. Quando essa escolha não é respeitada ou a assistência material é insuficiente para mitigar o sofrimento, o direito à reparação se fortalece.

O dano moral pelo atraso excessivo

Muitos consumidores se perguntam: “apenas o atraso gera dano moral?”. A resposta depende da gravidade da situação e do tempo de espera. Neste caso, o atraso foi de 22 horas, o que é extremamente significativo.

A sentença reconheceu que um lapso temporal dessa magnitude ultrapassa o limite do mero dissabor da vida em sociedade. O tempo perdido, o desgaste físico e emocional de ter um voo retornado após a decolagem, a espera no aeroporto e a incerteza sobre a nova viagem configuram danos morais.

O Juízo fixou a indenização com base nos critérios de proporcionalidade e razoabilidade. O objetivo dessa compensação financeira não é o enriquecimento do passageiro, mas sim compensar o sofrimento vivenciado e, pedagogicamente, punir a empresa para que melhore seus processos e serviços. No caso em questão, a empresa foi condenada a pagar R$ 3.000,00 ao consumidor a título de danos morais, além de arcar com as custas processuais.

Vale ressaltar que cada caso é único e os valores podem variar. Juízes analisam fatores como:

  • A duração total do atraso (quanto maior, mais grave);
  • A qualidade da assistência prestada (se o passageiro foi abandonado à própria sorte ou se teve suporte);
  • As consequências pessoais (perda de conexões, reuniões de trabalho, eventos familiares);
  • A vulnerabilidade dos passageiros (presença de crianças, idosos ou pessoas com deficiência).

Como agir em casos de falha técnica e atraso

Se você estiver em uma situação onde o piloto anuncia retorno por problemas técnicos ou o voo sequer decola por manutenção não programada, é fundamental manter a calma e reunir provas.

Passageiro conferindo cartão de embarque e painel de voo atrasado para proteger seu direito à indenização por falha técnica em voo.

Siga estes passos para proteger seus direitos:

  1. Registre tudo: Tire fotos dos painéis do aeroporto informando o atraso, guarde os cartões de embarque originais e os novos fornecidos na reacomodação.
  2. Peça a declaração de contingência: Solicite ao balcão da companhia um documento por escrito explicando o motivo do atraso ou cancelamento.
  3. Exija seus direitos imediatos: Se o atraso superar as horas estipuladas pela ANAC, exija os vouchers de alimentação e hotel. Guarde todas as notas fiscais de gastos extras que tiver (táxi, comida, itens de higiene) caso a empresa não forneça os vouchers.
  4. Não assine acordos precipitados: Muitas vezes, companhias oferecem créditos ou milhas de valor baixo em troca da renúncia de seus direitos de processar. Analise com calma antes de aceitar qualquer oferta no balcão.
  5. Procure ajuda especializada: Se a solução oferecida pela empresa não for satisfatória, ou se você sofreu prejuízos morais e financeiros, a orientação de um advogado especialista é recomendávelpara buscar a reparação integral.

Conclusão

A decisão judicial analisada neste artigo reforça que a segurança de voo é prioridade absoluta, mas isso não exime as companhias aéreas de suas responsabilidades perante o consumidor quando falhas ocorrem. Problemas mecânicos são riscos inerentes à atividade de transporte aéreo e não podem ser transferidos para o passageiro na forma de prejuízos e transtornos não reparados.

Se você enfrentou um atraso significativo decorrente de problemas técnicos na aeronave, saiba que a legislação brasileira é robusta e está do seu lado. O Código de Defesa do Consumidor e as resoluções da ANAC garantem que você seja assistido e, quando cabível, indenizado pelos danos sofridos.

Não deixe que o desgaste da viagem o impeça de buscar o que é justo. A orientação jurídica adequada é o caminho mais seguro para transformar o transtorno vivido em respeito aos seus direitos.

Dados da decisão analisada
  • Data da decisão: 21 de outubro de 2025
  • Número do processo: 1058403-62.2025.8.26.0100
  • Juízo: 19ª Vara Cível do Foro Central Cível da Comarca de São Paulo

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