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O sigilo médico é um dever inerente ao desempenho da profissão médica e é de fundamental importância na relação entre o médico e o paciente.
Vale frisar que no Brasil, o sigilo e a privacidade da informação são garantidos pela legislação.
Nessa via, a violação desse direito pode ser caracterizada como uma infração penal, cível e ética.
Isso posto, fique por dentro de quais são as regras do sigilo médico no país e saiba em que situações o médico pode “quebrá-lo”.
O que é sigilo médico?
Em suma, o sigilo médico ou segredo médico refere-se à confidencialidade de toda e qualquer informação tratada durante um serviço de saúde, seja uma consulta, exame, procedimento ou tratamento.
Ou seja, o profissional de saúde não pode compartilhar informações e comentários do paciente com terceiros, nem mesmo permitir que esses dados tornem-se públicos, salvo algumas exceções.
Portanto, trata-se de um um direito do paciente e um dever do médico.
Qual a importância do sigilo médico?
O sigilo profissional garante que as informações pessoais do paciente serão utilizadas somente para nortear o seu tratamento.
É fundamental apontar que quando alguém procura um médico, geralmente encontra-se fragilizado e vulnerável, e expor seus sintomas e sua doença pode, em alguns casos, expor também a sua vida íntima.
Afinal, durante uma consulta, podem ser revelados problemas, sentimentos, queixas, desabafos, entre outras coisas.
Nesse sentido, a garantia de que o médico manteria todo aquele contexto em segredo profissional contribui para a melhor relação entre médico e paciente.
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Quais são as principais normas que disciplinam o sigilo médico?
O sigilo médico é amplamente protegido na legislação brasileira. Veja a seguir quais são as principais normas que abordam e regulamentam o assunto.
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
A nossa Carta Magna é a lei fundamental e suprema do Brasil, e serve de parâmetro de validade a todas as demais espécies normativas, situando-se no topo do ordenamento jurídico.
Logo, como principal embasamento legal cabe citar, primordialmente, o que está expresso no inciso X, do art. 5º da Constituição Federal de 1988, que dá as seguintes providências:
- X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
Código Penal (CP)
Em suma, o Código Penal (CP) Brasileiro é uma lei formada por um conjunto de regras sistemáticas com caráter punitivo. Logo, é ele que define quais condutas são consideradas crime perante a lei.
Nesse sentido, essa norma legal possui artigos importantes que regulamentam o direito à privacidade. São eles:
- Art. 153 – divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa produzir dano a outrem;
- Art. 154 – revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem;
- Art. 269 – deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória;
- Art. 325 – revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação.
Código de Ética Médica do Conselho Regional de Medicina (CRM)
O Código de Ética Médica do Conselho Regional de Medicina (CRM) disposto na Res. (1931/2009) – Capítulo IX – que trata do sigilo profissional, determina que é vedado ao médico:
- revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente. Permanece essa proibição:
- mesmo que o fato seja de conhecimento público ou o paciente tenha falecido;
- quando de seu depoimento como testemunha. Nessa hipótese, o médico comparecerá perante a autoridade e declarará seu impedimento;
- na investigação de suspeita de crime, o médico estará impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo penal;
- revelar sigilo profissional relacionado a paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou representantes legais, desde que o menor tenha capacidade de discernimento, salvo quando a não revelação possa acarretar dano ao paciente;
- fazer referência a casos clínicos identificáveis, exibir pacientes ou seus retratos em anúncios profissionais ou na divulgação de assuntos médicos, em meios de comunicação em geral, mesmo com autorização do paciente;
- revelar informações confidenciais obtidas no exame médico de trabalhadores, inclusive por exigência dos dirigentes de empresas ou de instituições, salvo se o silêncio puser em risco a saúde dos empregados ou da comunidade;
- prestar informações a empresas seguradoras sobre as circunstâncias da morte do paciente sob seus cuidados, além das contidas na declaração de óbito;
- deixar de orientar seus auxiliares e alunos a respeitar o sigilo profissional e zelar para que seja por eles mantido;
- deixar de guardar sigilo profissional na cobrança de honorários por meio judicial ou extrajudicial.
Resolução nº 1.605/2000 do CFM
Além do Código de Ética Médica, no âmbito profissional da medicina, existe ainda a resolução nº 1.605/2000 que trata especificamente do sigilo profissional, determinando os seguintes regramentos:
- Art. 1 – o médico não pode, sem o consentimento do paciente, revelar o conteúdo do prontuário ou ficha médica;
- Art. 2 – nos casos do artigo 269 do Código Penal, onde a comunicação de doença é compulsória, o dever do médico restringe-se exclusivamente a comunicar tal fato à autoridade competente, sendo proibida a remessa do prontuário médico do paciente;
- Art. 3 – na investigação da hipótese de cometimento de crime, o médico está impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo criminal;
- Art. 4 – se, na instrução de processo criminal, for requisitada, por autoridade judiciária competente, a apresentação do conteúdo do prontuário ou da ficha médica, o médico disponibilizará os documentos ao perito nomeado pelo juiz, para que neles seja realizada perícia restrita aos fatos em questionamento;
- Art. 5 – se houver autorização expressa do paciente, tanto na solicitação como em documento diverso, o médico poderá encaminhar a ficha ou prontuário médico diretamente à autoridade requisitante;
- Art. 6 – o médico deverá fornecer cópia da ficha ou do prontuário médico desde que solicitado pelo paciente ou requisitado pelos Conselhos Federal ou Regional de Medicina;
- Art. 7 – para sua defesa judicial, o médico poderá apresentar a ficha ou prontuário médico à autoridade competente, solicitando que a matéria seja mantida em segredo de justiça;
- Art. 8 – nos casos não previstos nesta resolução e sempre que houver conflito no tocante à remessa ou não dos documentos à autoridade requisitante, o médico deverá consultar o Conselho de Medicina, onde mantém sua inscrição, quanto ao procedimento a ser adotado;
- Art. 9 – ficam revogadas as disposições em contrário, em especial a Resolução CFM nº 999/80.
É fundamental frisar que todas essas normas vigentes têm como objetivo proteção da intimidade dos pacientes, impedindo que informações pessoais sejam divulgadas a terceiros sem permissão dos mesmos.
Ademais, existe também a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) que reforça a premissa de que os dados pessoais não podem ser violados ou expostos.
Por fim, é importante destacar que a prática do sigilo médico está presente no Juramento de Hipócrates utilizado na graduação em Medicina, que retém em seu conteúdo os seguintes dizeres:
- “Aquilo que, no exercício ou fora do exercício da profissão e no convívio da sociedade, eu tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar, eu conservarei inteiramente secreto.”
Vale lembrar que esse juramento é obrigatório para que um estudante de medicina se torne efetivamente um médico.
Quando o médico pode quebrar o sigilo profissional?
Existem algumas situações específicas nas quais a violação do segredo médico também é garantida por lei.
Logo, a lei permite a quebra do sigilo médico em situações como:
- autorização expressa do paciente ou de seus responsáveis legais;
- notificação compulsória de determinadas doenças transmissíveis;
- suspeita de abuso a idosos ou ao cônjuge;
- suspeita de abuso ou agressão infantil;
- suspeita de dano causado por ato criminoso;
- abortos criminosos;
- ocorrência de ferimentos por arma de fogo ou similares.
Assim, apesar do sigilo médico garantir ao paciente a integridade de que as informações fornecidas serão usadas apenas para o seu próprio tratamento, esse direito pode ser violado principalmente em ocasiões nas quais o interesse coletivo é mais relevante que o do paciente.
Imagem em destaque: Freepik (katemangostar)